quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Mayhem - De Mysteriis Dom. Sathanas


Euronymous : Guitarras
Varg Vikernes : Baixo
Hellhammer : Bateria
Attila Csihar : Voz

Guest musician:
Blackthorn : Guitarras adicionais

Longa duração, Deathlike Silence Productions, 24 Maio 1994



Esta é a minha primeira review:
É irónico, dado o meu percurso como ouvinte de metal, iniciar reviews com o De Mysteriis Dom. Sathanas dos Mayhem. Milhares de reviews foram escritas e outras milhares surgirão com o avançar dos tempos. Isto porque o De Mysteriis continua a sua saga de imortalidade, continuando a ser explorado por diversos grupos de apreciadores (ou se calhar não tão diversos assim). Penso que o que enche este álbum de uma aura protectora - de culto – é, não só a sua história controversa, como a sua ingenuidade.
Longe de ser a primeira experiência de Mayhem no mundo do black metal (este é o seu primeiro longa-duração), De Mysteriis é lido como um marco incontornável do que foi a cena norueguesa do black metal em inícios dos anos 90, marcada como reacção ao death metal, ao declínio do thrash, à onda de popularidade e futilidade que marcou o fim de 80, registando-se, para alguns, como uma crise de criatividade.
Não só musical, a reacção do black metal ao cristianismo na Noruega marca uma posição irreverente, desprendida, que pretende reivindicar a sua autonomia, explorar os domínios do choque, reconhecendo-o como propaganda sem limites. Com interesse desmesurado em marcar a sua posição os black metalers optaram por cortar uma das veias mais frágeis da sociedade: a igreja como centro de uma comunidade, a fé cristã, a ordem social e até as leis.
Muitos apreciadores do género indicam este álbum como o fim, o resumo ou a conclusão daquilo que foi a cena black metal norueguesa. Nem mais nem menos. Neste álbum estão conjugados os vectores do que foi e do que continuará a ser (no espírito de muitas bandas posteriores) a sonoridade característica do black metal. Lembro-me, por exemplo, da reinterpretação que as Les Legions Noires fizeram do movimento, dando-lhe novo fôlego e novo sopro de vida em meados de 90.
Quer queiramos quer não, o black metal é marcado pela crueza, pela aridez e pelo niilismo nas palavras e no som. Agreste, para mim, é a palavra ideal para qualificar o De Mysteriis. Niilista é o ambiente que o rodeia, porém, repleto de intencionalidade. Expressivo, naquele que é o manifesto das loucuras da alma. Ingénuo, naquela que é a sua simplicidade, porta-voz de uma sensibilidade directa, um murro no estômago, uma performance maléfica e com pretensões à transcendência, porém num patamar tão real e definitivamente perturbador.
Imagino a performance do Attila em cima de um palco de teatro, com o seu esgar à beira da loucura e do suicídio, com pequenos momentos de lucidez. Imagino as ambições juvenis do falecido Euronymus que sabia ter em mãos uma masterpiece que resolveu defender até ao fim. Foi o seu último manifesto antes de passar para um mundo onde sempre escolheu viver. Os seus solos como ecos sólidos daquilo que viria a ser a sua sensibilidade de compositor. Queria destacar o solo da “Freezing Moon”, que (boatos correm) nem o próprio repetiu duas vezes. O que ficou gravado no CD foi um momento único, clássico (como muitos o chamam), sensível, quase ingenuamente elegante, obscuro, perene e emocional.
Porventura, alguém mais especializado do que eu, afirmou que o álbum contêm momentos muito repetitivos além de simplistas. Não discordo, mas a repetição e simplicidade na composição musical são-me muito caras por isso o meu gosto pessoal é impermeável a essas características que tolero e até procuro.
A voz reduzida ao sussurro foi alvo de crítica um pouco negativa e penso que seja um dos pontos fracos da obra, embora acredite que, por vezes, existe uma sinergia entre a voz e a música que me agrada pela sua determinação teatral. Varg, no baixo, não encontrou muito espaço para brilhar, destaco a prestação no “Life Eternal”, embora o admire enquanto compositor não creio que neste registo tenha deslumbrado muito. E embora pouco perceba de bateria Hellhamer, para mim, sempre foi sinónimo de virtuosismo precoce. Nada mais a acrescentar.
Este álbum, como muitos outros, cresceu bastante durante uma audição. Por vezes damos diversas hipóteses a um registo mas acabamos por não conseguir entrosar-nos. Depois há um dia em que, inexplicavelmente, ele legitima-se como um dos preferidos, como se conseguisse explicar-se por si, acabando até por ocupar um lugar no pódio pessoal. De Mysteriis Dom. Sathanas é um deles: tortuosa audição sobre um tortuoso fim, porque o black metal persegue e há-se sempre perseguir os rostos do fim.


Para informações adicionais e reviews ler http://www.metal-archives.com/ entrada Mayhem

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